Ted Lasso encontra seu final ao meio de lágrimas e sensação de dever cumprido
Poucas são as séries que se contentam em serem curtas. Afinal, é justamente pela projeção em anos – se possível décadas – que se acumula uma base de fãs suficiente para gerar engajamento, licenciamento de produtos, spin offs e otimizar todo o investimento inicial, e não faltam exemplos como Supernatural ou Grey´s Anatomy que se arrastam mesmo perdendo protagonistas, a ponto de haverem piadas sobre os atores estarem em cativeiro. Assim, poucas temporadas viram sinônimo de cancelamento, de forma que um sucesso estrondoso encerrado nas três temporadas indiscutíveis de Ted Lasso se tornam tão únicas e peculiares como a forma que o treinador trabalha, ou mesmo a origem de seu personagem.
Ted Lasso surge de uma série de comerciais que Jason Sudeikis fez para a cobertura da Premier League pela NBC Sports, e fez tanto sucesso que a Appe TV comprou a ideia e transformou em uma produção original de seu canal de streaming, trazendo a história de um treinador de futebol americano de mesmo nome que é trazido para treinar um time medíocre de futebol inglês, mudando não somente de país como de esporte, e sua trajetória e conquistas são contadas ao longo de três temporadas impecáveis que falam sobre tudo – até mesmo futebol.
Durante essas três temporadas são discutidos diversos temas, de casamento, criação dos filhos, emprego, empreendedorismo, orientação sexual, cobiça, sucesso e até mesmo saúde mental, transformando uma série que deveria ser sobre esportes em algo muito mais abrangente, implicando inclusive em importantes lições sobre liderança e vida corporativa – talvez por isso mesmo muitos defendem que o esporte é a metáfora definitiva sobre a vida.
Mas de nada adiantaria a existência de discussões interessantes se a forma como isso é contado não funcionasse. Através de personagens extremamente carismáticos, seja em seus defeitos ou suas qualidades, Ted Lasso impacta por causar uma empatia forte e imediata, pois diferentes expectadores vão se identificar com seus personagens variados, do boleiro velho, ao arrogante atacante do time, passando pela presidente do clube e pela modelo que vira empreendedora; enfim, o elenco, composto de ilustres desconhecidos, vai ganhando episódio a episódio o coração de quem assiste, tanto que a série colecionou Emmys, SAGs, Globos de Ouro e Critics Choice Awards em sua curta existência.
Bem produzida e ornada com uma boa trilha sonora e belas fotografias que compõe sem tirar o foco, a direção de Zach Braff (o conhecido JD de Scrubs) é feita de forma sutil e apaixonante, de modo que quem assiste aos primeiros episódios não saber o que esperar, dissonando do rótulo de comédia que lhe foi atribuído. Haverão momentos de risadas, e estes serão hilários e melhores que qualquer sitcom, mas serão menos frequentes que os momentos calorosos em que o público se sente acolhido por um velho amigo, ou mesmo levado à lágrimas inesperadas pela sensibilidade de situações tão reais quanto emocionantes.
Assim, em um final agridoce na qual a série entrega absolutamente tudo, e consegue fechar cada arco narrativo com perfeição e delicadeza, completando um círculo sem deixar nenhuma ponta solta do primeiro ao último, Ted Lasso se despede de fãs que ao longo de três curtos anos se tornaram tão apaixonados quanto os fãs do A.F.C. Richmond, deixando olhos marejados por um sentimento de saudade iminente de personagens humanos e reais, como há muito tempo nenhuma série conseguia. Obrigado coach Ted.